Ninguém, na real, quer gerenciar crises dentro das empresas. Primeiro porque é difícil saber diferenciar entre os incidentes, quais vão ou não se tornar uma crise. A maior parte das crises surge por negligência a riscos potenciais e sinais de alerta anteriores, mas a maior parte dos incidentes nunca se tornarão uma crise.
Segundo porque elas são complexas de administrar. Não há um manual a ser consultado para todos os casos. Cada situação gera uma reflexão específica e soluções customizadas.
Terceiro porque as respostas à crise devem ser muito rápidas e muita gente tem insegurança na hora de tomar decisões. Se aguarda-se para ter todas informações sobre o caso, demora-se muito para responder. Se responde-se prontamente, corre-se o risco de decisões precipitadas e que mostram-se equivocadas com o tempo, muitas vezes tendo a empresa que voltar atrás em pronunciamentos, o que é péssimo para sua imagem.
Quarto porque elas tiram nossa atenção do trabalho do dia-a-dia (considerando que dificilmente há equipes dedicadas somente ao gerenciamento de crises nas empresas).
Quinto porque é complicado saber quem envolver internamente na hora da crise. Se envolve-se um grupo grande de pessoas para decidir, demora-se muito para responder. Se envolve-se poucas pessoas, corre-se o risco de não olhar para todos os ângulos do problema e dos impactos gerados pela decisão.
Sexto porque há quase sempre um grande dilema quanto às respostas ao consumidor e notas para a imprensa. Se o jurídico, por exemplo, tem grande influência do teor das notas, em geral a empresa é pouco transparente e as respostas tendem a ser mais superficiais. E o consumidor atualmente não quer saber de “juridiquês” e exige respostas com informações concretas e pessoais. Se o jurídico não tem grande envolvimento, por outro lado, pode-se pecar pela exposição demasiada das informações da empresa.
Sétimo porque as crises em geral nascem de falhas internas da empresa e é muito complicado gerenciar relações nas empresas de modo a ir a fundo nos problemas, sem expor um colega e criar algum atrito internamente, mesmo involuntariamente. Para gerenciar crises é necessário um trabalho muito integrado e multifuncional dentro da empresa e a gente depende sempre da boa vontade das pessoas, no final das contas, independente de manuais e treinamentos. Infelizmente, grande parte dos colegas está mais preocupada com as suas metas do final do mês e não com impactos negativos futuros na organização. A visão de curto prazo impera nas organizações. Assim como as separações entre as áreas. Mas para gerenciar crises é necessário “escarafunchar” até encontrar a causa-raiz dos problemas e tentar evitar que o mesmo erro volte a acontecer. A empresa é uma só e o consumidor não quer saber de qual departamento é a culpa.
O gerenciamento de crises não começa com o surgimento da crise e não termina quando a crise está controlada. Ele começa muito antes, com o mapeamento dos riscos e elaboração de planos de contingência, com a organização de equipes de crise, de processos de crise bem definidos em termos de papéis, tempos, responsabilidades, com treinamentos e simulações constantes para toda a liderança da empresa, com o engajamento da alta liderança no tema e definição prévia de porta vozes habilitados e preparados formalmente para falar pela empresa. A oitava razão é porque são poucos os CEOs e líderes realmente engajados no processo e disponíveis a qualquer momento para colaborar e, se necessário, “dar as caras” diante de uma crise.
O gerenciamento de crises só termina com a reflexão sobre as lições aprendidas em cada caso, mapeamento dos erros e revisão dos processos. Muitos experts no tema dizem que as crises são sempre negativas para as empresas, à despeito dos aprendizados – e esta é a nona razão – as pessoas não querem estar ligadas aos fatos negativos e preferem não voltar a tratar do tema depois do “leite derramado”. Eu já sou otimista e vejo oportunidades sempre. Como não aprender pela dor?
Décima porque uma crise não espera a outra acabar para começar. É preciso saber lidar com incidentes concomitantes. E não adianta rezar pra nova crise não aparecer às sextas-feiras final da tarde ou na hora do almoço de domingo. Está é a décima primeira razão, por fim. Quem trabalha com gerenciamento de crise precisa ter aquela adrenalina positiva 24/7 – como um bombeiro ao tocar a sirene – para que no momento em que o telefone vermelho tocar, mesmo que seja às 5h da manhã, a gente conseguir agir de modo eficaz. Depois, já com a crise controlada, embora quase sempre fiquem marcados alguns arranhões, poder enfim respirar e ter aquela sensação confortante de missão cumprida.
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